A Visita


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Eles eram parentes distantes. Nunca se viram antes e só se comunicavam por cartas. Era um costume daquela família, a comunicação com todos os parentes distantes, somente por correspondências.
.......Ele precisava fazer uma viagem para muito longe, ainda dentro do país. Em meio ao caminho, em uma grande cidade, sua prima vivia. Ela muito o admirava. Ao mesmo tempo em que ele tanto a respeitava. Mais que parentes, eram amigos. Bons amigos.
.......– Olá, minha linda prima.
.......– Math, é você mesmo? – Os olhos dela brilhavam de alegria ao ver seu parente assim, de surpresa. Ele sempre prometia que iria fazer uma visita, mas nunca imaginou que seria de verdade, o que ele tanto falava.
.......– Estou no meio de uma viagem importante. Lembrei que você mora no caminho, então decidi pagar aquela promessa que um dia fiz – ele falou sorridente.
.......Ela demora a entender o que ele tanto falava. Foi um choque. Algo que não era esperado. Lembrou-se do que ele falara na semana anterior: “Vou dormir esta noite com você em meus pensamentos”. De fato, ele assim o fez. Já estava planejando essa inesperada visita.
.......– Vamos! Você está cansado. Viajar de trem é exaustivo. Você precisa de um bom banho e uma cama quentinha. – Ela o pega pelo braço, se encostando, e o carrega consigo.
.......– Filha, não durma muito tarde e deixe seu primo descansar. Amanhã ele viaja cedo. – falou a mãe dela.
.......– Sim, mãezinha.
.......– Boa noite, tia. E, obrigado pela ótima recepção.
.......– Obrigada, você. Pela visita. – Bocejando, ela vai para seu quarto.
.......Eles jantaram juntos e Math foi muito bem recebido por todos. Passaram a noite conversando e aos poucos cada um ia para seu aposento. Ficaram apenas os dois.
.......– Não se passa nada de interessante nessas horas na TV – ela falou, desligando-a. É curioso, o seu pijama. Ele é preto e possui morceguinhos.
.......– É verdade. Isso só me dá mais sono. – Ele sorriu.
.......Ela coloca-o em seu colo, acariciando seu cabelo.
.......– Assim, eu durmo! – ele falou, com um moderado sorriso.
.......– Você precisa.
.......– Desse jeito, até sonharei.
.......– Sonhe e depois me conte o que sonhou.
.......– Contarei, nos mínimos detalhes.
.......– Eu espero. – Ela brincou.
.......O silêncio se torna constante, e ele dorme.
.......Ela o observa enquanto ele dorme, continuando a acariciá-lo.
.......No meio da madrugada, ele acorda. Não está escuro. Ela sabia que ele odiava dormir na escuridão total. Ele se levanta, vê que ela está dormindo no sofá ao lado. Está descoberta e a noite é fria. Ele a cobre com um cobertor. Após observá-la dormir por alguns instantes, ele se aproxima, e a beija. Ela, ainda dormindo, vira para o lado, se aconchegando.
.......– Bom dia! – Amanheceu e chega a hora de partir.
.......– Está tarde, temos que ir.
.......A estação de trem não era distante. Ela não foi à aula para acompanhá-lo.
.......– É... Está quase na hora de sua ida.
.......– Verdade.
.......– Que triste. Foi tão rápido. Pouquíssimo tempo. – Ela bufou.
.......– Queria te dizer uma coisa.
.......Ela, atentamente, sorrindo, espera para ouvir o que ele tinha a dizer.
.......– Na noite de ontem, eu te beijei.
.......– Aham – ela confirmou como se já soubesse.
.......– Você sentiu?
.......– Sim. – Ela não tinha certeza do que falava.
.......– Acho que não. Onde foi?
.......– Hmmm. – Ela pensa.
.......– Você não sabe. Estava dormindo em sono profundo. Eu beijei a sua boca.
.......Ela ficou surpresa, caindo em gargalhadas, meio sem jeito.
.......– Perdão! Não fiz por mal. Não farei novamente – olhando para o chão, ele falou.
.......– Nada. Não peça perdão.
.......Alguns segundos de silêncio tomam conta da cena.
.......– Estou surpresa.
.......– Eu estou sensível. Desculpa. – Ele entristeceu o olhar.
.......– Pare de pedir desculpas.
.......– Saiba que ainda sou seu primo mais velho e sempre te respeitarei.
.......– Sim, sim. Meu Math querido, você não fez nada. Calma! – Ela arregala os olhos.
.......– Me desculpa – ele insiste, logo ficando nervoso.
.......– Não precisa pedir.
.......– Eu te tratei como uma mulher. Diferente do que antes eu sempre fiz. Antes, como minha linda priminha e grande amiga. Eu prometo que não farei de novo. – Ele se conformava como se aquilo fosse um grave crime.
.......– Calma!
.......Ele se acalma. Ela para e pensa.
.......– Mas, se porventura, isso acontecesse sem que eu estivesse dormindo?
.......Ele não entendeu e arqueou uma das sobrancelhas.
.......– Se acontecesse agora, você sairia falando isso?
.......– Se acontecesse o quê?
.......– Um beijo.
.......– Um beijo, nosso? Como de um casal apaixonado?
.......– Sim. Seria algo momentâneo. Não precisaria se desculpar. – Ela tenta explicar para ele que aquilo não era algo grave e que ela estava bem e que não ficou triste ou sentiu raiva.
.......– Acho que eu te pediria perdão da mesma forma. Eu desejei isso. Por isso que peço perdão. O pecado não está na ação, mas no pensamento antes mesmo de acontecer.
.......– E, por que desejaste? – ela perguntou, seriamente.
.......– Por que você me faz perguntas? – com a voz suave, ele perguntou.
.......Eles continuavam a caminhar.
.......– Por que, quero saber. – ela respondeu fazendo carinha de inocência.
.......– O modo como você me trata e sempre me tratou, me faz bem. Então, pensei em você como uma garota. Não como uma amiga.
.......– Acabei de pensar e ver na minha cabeça o que você me falou.
.......– Pensou no quê?
.......– No beijo.
.......– Pensou no beijo? – ele perguntou, indignado.
.......– Aham! Pensar, todo mundo pensa. – Ela sorriu.
.......– O que você sentiu ao pensar?
.......– Senti como se estivesse acordada.
.......– Foi um sentimento ruim?
.......– Não. E você, o que sentiu ao me beijar?
.......– Uma dúvida me perturbando, pois eu não sabia se você gostaria de saber que te roubei um beijo. Perdão, querida. Mas, você faz perguntas, aí respondo. Complicando mais ainda a minha vida.
.......– Você gostou de ter me roubado um beijo?
.......– Eu não gostei. Preferia ter pedido. Fui atrevido.
.......– Foi. Mas, você não pôde se conter.
.......– Mas, não é assim que as coisas funcionam. Por alguém não se conter, ele pode matar, roubar e fazer coisas erradas. – Ele se frustrou.
.......– Mas, isso acontece. É natural.
.......Ele se cala.
.......– Por que estamos debatendo sobre isso? – Ela sorri.
.......Eles chegam próximo da estação de trem. Param, um frente ao outro. Pessoas andam pelo redor. A chuva cai, levemente. Quantidade que mal dá pra sentir no corpo. O frio está arrepiante, mas é suportável. Um cão atravessa na rua, quase sendo atropelado. Do outro lado, um mendigo pede esmolas, próximo a um cruzamento. Guardas multam um carro que se encontra estacionado em local proibido. Ele pega na sua mão esquerda e diz:
.......– Belly... Posso te beijar?
.......– Pode – ela respondeu, naturalmente.
.......Depois de acariciar seus lábios com seus dedos, ele a beija, suavemente.
.......Ela responde ao beijo, meio que desconcentrada e se perde.
.......“Pensei que ele me daria um beijo no rosto.”
.......Ela não o ama como um casal de namorados. Mas, faria de tudo para vê-lo feliz. Ele ficaria extremamente surpreso se pudesse ler os pensamentos dela. Ela pensa em parar de beijar, mas não consegue. Pois, acha que se parar, poderá magoá-lo. Ele se aproxima ainda mais, logo a abraçando.
.......Ele sabe que aquele beijo poderia não ser de um casal apaixonado, mas com certeza havia muito carinho e um afeto imenso. Ela sente a proximidade do corpo dele de forma intensa, ainda com uma certa delicadeza. No interior do seu próprio corpo, sente algo diferente. Será que ela poderia estar gostando daquele beijo? Sentimentos ocultos, antes nunca revelados, nem mesmo para os seus donos.
.......Como ela não gostaria? Ele não abre os olhos e não a solta, explorando cada canto de sua boca, agindo como se fosse um garoto extremamente apaixonado. Ela estava se sentindo amada. Ela, realmente, deseja o que está acontecendo mais do que tudo e começa a se recompor, querendo ficar mais perto dele, como se fosse possível. Mas, existem coisas no mundo que parecem ser impossíveis quando são, ocultamente possíveis. Então ela consegue.
.......Ela afaga o rosto dele e explora cada canto de sua boca, mordendo levemente seus lábios. Ele se sente muito bem. Fisicamente e mentalmente. Parece um sonho. O paraíso. Paixão. Quem imaginaria que seria assim? Parece loucura. Mas, era bom e ele não se arrepende.
.......Ela sente um queimar em seu corpo, como brasas que nunca se apagam. Se sente cada vez mais amada. Esse momento poderia ser eterno. O tempo poderia parar. De fato, neste momento o tempo parou.
.......A chuva se tornou intensa. O cãozinho se esconde por baixo de um carro estacionado. Os guardas, guardando rapidamente suas anotações, correm para não se molhar. As pessoas sumiram. Sobrou a intensa chuva e o casal que ali ficou, parou, se fixou.
.......Ela amava o jeito dele ser, de agir. Era paixão? Ela estava perdendo o fôlego, mas fazia um extremo esforço para continuar e não parar de beijá-lo. Assim ficaram por um longo tempo. Parados no tempo.
.......Ele para e abre os olhos. As águas celestes diminuem. Acariciando aquele sensível rosto e olhando nos olhos dela, ele diz:
.......– Você é linda e, isso aqui – ele aponta, tocando no peito dela –, é a coisa mais bela em sua beleza. Seu coração. A forma que você ama, cuida. Eu desejaria te ter.
.......Ainda recuperando o fôlego ela diz:
.......– E eu desejaria ficar a vida inteira em meio aos seus abraços.
.......– Pra mim, isto foi ótimo. Espero que você nunca se arrependa. Eu vou, mas o meu sentimento, aqui demonstrado, fica. Em minha memória, o agora ocorrido, ficará comigo. Sorrirei sempre que eu lembrar que um dia, por pouco tempo, apenas um momento, o tempo parou e você foi minha.
.......– Eu sempre me lembrarei de todos os detalhes deste dia. Meu coração aperta em pensar que irei te dizer adeus.
.......Depois de alguns segundos de silêncio, ela continua:
.......– Eu amo você.
.......O trem chega e ele se vai.
.......Ela, sentindo um aperto em seu coração, como se o mesmo fosse tirado e jogado fora, silenciosamente, chora. Enquanto chora, relembra os últimos minutos de amor que tivera e pensou:
.......“Eu sempre o amarei, querido Math.”
.......Na janela, tudo passa muito rápido para ele, menos o seu eterno pensamento.
.......Eu a levarei comigo. Como parente, amiga ou amada. Em meu coração, ela sempre estará.”



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Imagem: Trem Inglês - Andrea
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4 comentários:

  1. Anônimo18:24

    Eu não sei o que dizer, nesse momento só posso dizer que eu amo você.
    Beijos da sua bell

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  2. S2 S2 S2
    Ela disse que me ama!!!! *-*
    S2 S2 S2
    Honrado e muito agradecido.
    Um beijo, querida.

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  3. Aah, que lindo *-*
    Se tem uma coisa que eu A-M-O descrever são as cenas de beijo...
    Se eu pudesse faria umas 5 páginas só pra eles!
    Adorei o conto Bruno
    (:

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  4. S2 Obrigado Polly ^^
    Esse não foi um conto pensado ou planejado e etc. rsrs
    Tipo, foi algo bem rápido... Tudo gira em torno de uma visita bem rápida e o foco está naquele beijo. A cena do beijo (a inspiração inicial e primordia) foi a razão da criação do conto.

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